No final do século XIX, o pequeno arraial de Belo Monte tornou-se um refúgio para milhares de sertanejos, vindos de toda a parte do Nordeste brasileiro em busca de sustento, comida e segurança. Liderados pelo religioso Antônio Conselheiro, a comunidade de Canudos viveu com relativa prosperidade até 1896, quando tropas do Exército da recém implantada República começaram uma série de incursões à comunidade, que resistia bravamente. Os ataques, porém, continuvam incessantes, culminando em um dos episódios mais sombrios da História Brasileira: o Massacre de Canudos, onde mais de 25000 pessoas foram eliminadas. Um episódio terrível, e infelizmente pouco lembrado no resto do Brasil. Então, quando soube que Hell Clock seria um jogo baseado nesse acontecimento, minha expectativa ficou bem alta. Afinal, não é todo dia que um jogo toca em fatos históricos brasileiros, ainda mais um jogo de ação! Mas será que o hype foi justificado?
Gênero: Roguelike, ARPG
Lançamento: 22/07/2025
Plataformas: PC
Tem idioma PT-BR: Sim
Desenvolvido por Rogue Snail
Publicado por Mad Mushroom
Tempo de violência
No jogo, você é Pajeú, um cangaceiro que vivia na antiga comunidade de Canudos, e que segue em uma cruzada solitária até as profundezas do Inferno para resgatar a alma de Antônio Conselheiro e se vingar das forças demoníacas responsáveis pelo massacre de seu povo. Para ajudar em sua aventura, Pajeú conta com um velho revólver, suas fiéis pexeiras e um relógio mágico, que o protege das forças das trevas e garante alguns poderes sobrenaturais.
A proteção do relógio, no entanto, não é eterna: cada nova incursão ao Inferno ativa um contador, que corresponde ao tempo máximo em que Pajeú pode ficar naquele ambiente. Com isso, seu objetivo consiste em enfrentar hordas de inimigos e progredir o máximo possível dentro do limite de tempo estipulado. Caso o tempo ou sua vida acabem, você é transportado de volta para o sertão e o ciclo se repete. Como o tempo está sempre correndo, existe um certo elemento estratégico sobre quais lutas você deve pegar e quais você pode passar direto. Porém, os monstros básicos são a melhor fonte de dinheiro e experiência para melhorar seus atributos e ataques especiais. Passar direto por eles vai poupar tempo, mas vai te deixar mais fraco contra os chefões e outros confrontos obrigatórios da campanha.
De certa forma, a luta contra o relógio também influenciou o level design do jogo: o mapa é dividido em 21 andares, em cada andar funciona como uma pequena dungeon bastante linear. Há pouquissímas ramificações ou desvios de caminho, e quando existem, são desvios curtos que levam a baús de tesouro ou totens de habilidade. Embora a localização e o conteúdo desses baús e totens seja aleatória em cada run, as dungeons em si são fixas. Ou seja, os corredores e encontros serão sempre os mesmos independente da sua run.

Diablo, mas com tempero nordestino
Ao adentrar em uma igrejinha em ruínas e atravessar diversas dungeons em direção ao Inferno, jogadores mais experientes logo de cara já vão perceber as semelhanças com Diablo, o famoso ARPG da Blizzard. Se você também é fã de jogos do tipo, saiba que as semelhanças não param por aqui!
Apesar do seu progresso ser perdido a cada run, durante a aventura Pajeú pode coletar diversos itens equipáveis, como armas, roupas e amuletos. Esses itens são permanentes, e podem ser equipados em sua base. Assim como todo bom ARPG, cada item é dotado de um afixo: aqueles adjetivos que garantem determinado encantamento ao item. Os itens também são divididos em Comum, Mágico e Raro onde quanto maior a raridade, maior é a quantidade afixos. Existem também os chamados itens Únicos, que possuem um nome e visuais próprios. Apesar de ocupar mais espaço nos slots de equipamento, os itens Únicos alteram muito as habilidades de Pajeú, e se usadas com outros itens, garantem sinergias poderosas.
Há, por exemplo, uma relíquia que faz com seus tiros façam os inimigos explodam, provocando dano tóxico aos inimigos próximos. Essa relíquia, aliada a um item que aumenta o dano tóxico causa uma reação em cadeia, fazendo com que todos os inimigos atingidos pela explosão inicial também explodam, e assim por diante.
Em sua base também é possível modificar e melhorar os itens, gastando itens consumíveis que são obtidos durante as partidas.

Além dos itens, existe um outro recurso permanente entre uma run e outra: os chamados Fragmentos de Alma. Esse recurso serve como moeda para comprar novos itens, melhorar os já existentes e adquirir novas habilidades. Coletar uma determinada quantidade delas também garante pontos de habilidade, que podem ser utilizados na extensa árvore de habilidades de Pajeú. Essas habilidades são permanentes e garantem diversos bônus passivos, como mais vida, mais dano ou mais tempo em seu cronômetro.

Veredito: Recomendado
Ao misturar elementos de Roguelite a um ARPG extremamente competente, Hell Clock é um dos raros exemplos em que uma mistura inesperada resulta em um casamento perfeito. As partidas rápidas e upgrades aleatórios da parte roguelite permitem explorar diferentes builds sem todo o compromisso dos ARPGs clássicos, assim como os elementos permanentes como habilidades e itens equipáveis dão aquele senso de progressão constante, mesmo nas partidas onde você não foi tão bem. No entanto, os mapas fixos e a pouca variedade de inimigos pode tornar a experiência repetitiva, especialmente no primeiro ato da campanha.
Quanto à parte visual e sonora, são um show à parte. O jogo apresenta visuais em cel-shading com contornos e sombras bem marcados, quase como em uma ilustração de cordel. Esse visual é ainda mais marcante nas cutscenes do jogo, composta por belíssimas animações exibidas em pontos chave da campanha. Animações essas acompanhadas por uma excelente atuação de voz, com direito a sotaques e expressões regionais típicas da época, sem parecer forçado ou caricato.