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Coralina: A Memory Tale – Uma Viagem Psicodélica Entre os Mortos? Vivos? Desgarrados?

O que acontece se você tentar contar uma história e expressar seus sentimentos por meio dos videogames? Com certeza já temos diversos exemplos disso, mas muitos se levam a sério demais e poucos conseguem trazer os aspectos lúdicos que os games possibilitam. Um exemplo claro dessa linha de jogos é a série Mother – conhecida no Ocidente como Earthbound – que inspirou títulos como Undertale e Eastward. Esses jogos podem até constituir um próprio gênero: Earthbound-like, talvez? 

Gênero: Aventura, Narrativo, RPG-like
Lançamento: 13/09/2024
Plataformas: Steam
Tem idioma PT-BR: Sim
Desenvolvido por Gabriel Maki
Publicado por ZNT Production

Brincadeiras à parte, são jogos que se destacam por histórias cativantes, conduzidas por um passeio lúdico que nos apresenta personagens envolventes, com um texto narrativo que une a experiência como um todo. Essas narrativas não se assemelham a livros, como no caso das Visual Novels, mas utilizam elementos exclusivos dos videogames para adicionar contexto e expressividade.

Hoje, falaremos sobre Coralina: A Memory Tale, um jogo que segue essa linha para construir um universo único e contar uma história envolvente, cheia de bons momentos emotivos. Esse jogo é a continuação de Coralina, o primeiro título de Gabriel Maki, desenvolvido com a colaboração de diversos artistas. Talvez, à primeira vista, alguns possam ver as imagens e pensar que os gráficos são simplórios, mas já adianto que a experiência artística como um todo é bastante significativa. Admito não ser para todos, já que a estética não segue os padrões comuns da indústria. Isso pode ser um problema para alguns, mas para mim foi um charme especial, que irei elaborar mais adiante.

A vida é assim mesmo, Cometa

Narrativa Psicodélica com Respiros Emocionantes

Agora, vamos a um resumo da história do jogo. Fiquem tranquilos, é sem spoilers. Coralina é uma estudante de Cinema que passou por um evento traumático no primeiro jogo e agora se encontra em um mundo onírico, conhecido como “Terras Póstumas. Durante essa jornada, você, no controle de Coralina, estará acompanhado por dois personagens importantes: um corvo falante e uma garota de cabelos roxos chamada Cometa. Juntos, eles compartilharão a experiência de desvendar os mistérios desse mundo enquanto tentam voltar para casa. Neste jogo, especificamente, você e Cometa estão em uma jornada para descobrir os segredos do grande Alquimista, o criador deste mundo.

Esse pequeno resumo talvez tenha sido curto demais, mas pense nessa possibilidade de conhecer um lugar chamado Terras Postumas com um corvo falante e uma amiga de cabelos roxos (por que roxo é importante? você deve estar se perguntando), em uma jornada com psicodélica, mistério e elementos fantásticos que lembram filmes como Viagem de Chihiro e História Sem Fim. Esta é a melhor forma que consigo descrever sem estragar a experiência de jogo, mas saibam que esses elementos combinados com muita personalidade foram o que me passaram um senso de aventura semelhantes à quando joguei Undertale e Earthbound. 

À primeira vista, a história se mostra simples, mas rapidamente se transforma, trazendo elementos de fantasia alucinantes, com reviravoltas surpreendentes e temáticas humanizadoras que me deixaram refletindo. Sempre me vi pensando: “Ahn? Como assim? O que acabou de acontecer?” Esses questionamentos são, para mim, um ponto de destaque, pois aumentavam a curiosidade pelo que viria a seguir.

E essa história é construída com uma mescla constante de acontecimentos impressionantes articulados com um texto que explora nuances intimas e emotivas dos personagens, humanizando-os e amarrando os eventos da história. Em resumo, o jogo nos coloca em diversos diálogos que trazem muitos sentimentos, tanto nos exageros quanto nas sutilezas de conversas mais casuais entre os personagens. Frequentemente, levantei um sorriso, meus olhos lacrimejaram ou coloquei mão na boca de surpresa, conforme mais e mais eu conhecia os personagens e suas motivações.

Gostaria de destacar uma ousadia interessante na construção narrativa, onde o texto utiliza um tipo de “pausa dramática” para criar expectativa, que acho fica mais adequado dizer que o jogo tem “respiros” entre os diálogos.  Esses “respiros” se tratam de uma ligeira pausa entre os diálogos ou troca de cenas. Parece algo pequeno, mas na prática foi uma estratégia de contar interessantes, pois me fez cadenciar o ritmo da leitura, freando-me quando estava lendo muito rápido, por exemplo. Isso me fez apreciar certos momentos e me manter mais na história. No entanto, houve momentos em que esse “respiro” foi longo demais, a ponto de eu pensar que o jogo havia travado. Apesar disso, parabenizo pela ousadia e fico ansioso para ver essa mecânica (posso chamá-la de mecânica?) refinada nos próximos capítulos da história.

dona Lua, acho que tem algo no seu olho

Expressionismo, expressado na expressão de muitos: arte

Se existe algo encantador em Coralina, são os gráficos. Confesso que, à primeira vista, pensei que o jogo fosse algo genérico, feito no RPG Maker ou utilizando assets de alguma biblioteca, mas posso garantir que é exatamente o oposto. A arte de Coralina aposta em um estilo bastante expressionista, com muitas cores vibrantes e variadas. Isso pode ser visto como um ponto negativo por alguns, mas, para mim, foi fundamental para o impacto sensorial que o jogo me causou. A falta de um padrão estético, neste caso, serve como uma forma de desenvolver a própria narrativa e se torna qualidade do jogo. Porém, admito que essa interpretação vem de mim, como entusiasta de artes e expressões diversas e isso pode não ser visto como qualidade para outras pessoas.

Digamos que o caos é fascinante e que cada variação artística ajuda a narrativa a evoluir, como se cada estilo visual fosse uma nova camada da história. Cada cenário, cada personagem, contribui para esse universo psicodélico de maneiras inesperadas, tornando a jornada ainda mais envolvente. Afinal, quem disse que a arte não pode ser caótica?

Aliás, gostaria de abrir um parêntese aqui para dizer que deveríamos nos abrir mais a experiências diversas e reavaliar nossa relação com os jogos, que muitas vezes tem sua qualidade definida a partir da padronização dos elementos. Algo é considerado bom apenas quando segue um padrão constante, dentro das normas da indústria de games e dos manuais de design. Em resumo, é uma visão muito restrita e limitante da arte e, portanto, quero lembrar que a noção de belo é mais do que aquilo fácil de consumir, de sabor previsível.

Em Coralina: a Memory Tale, o belo aparece na coerência imaginativa que ocorre quando somos confrontados com diferentes estilos artísticos de vários artistas, que, em nossa mente, acabam por criar sentido. É uma sensação que cresce conforme jogamos; aquilo que inicialmente parece estranho vai criando expectativa pela próxima novidade visual. É algo que bagunça os sentidos e nos leva experiências significativas. Contudo, admito que é necessária uma abertura para isso, e sugiro que quem for jogar esteja preparado para essa experiência. No meu caso, foi justamente aí que percebi uma construção afetiva entre essas diferentes artes. Honestamente, parece ter ocorrido um processo de alteridade, no qual eu ficava curioso para ver como cada artista que participou da produção do jogo iria expressar sua visão em cada momento. Nesse sentido, pode-se dizer que, aqui, a diferença é qualidade. 

Como último comentário sobre a arte, gostaria de falar que a trilha sonora é muito competente e ajuda a aumentar a carga emotiva dos momentos do jogo. No entanto, preciso criticar o ajuste de volume (loudness), que parece mal regulado, com transições abruptas de momentos de música suave para outros em que ela está muito alta. Isso me causou desconforto, a ponto de precisar ajustar o volume rapidamente. Um ajuste nesse aspecto certamente melhoraria a experiência, ainda mais considerando pessoas com alta sensibilidade auditiva, como alguns neuro divergentes. 

🤔🤔🤔🤔🤔

Jogabilidade Simples, mas esse não é o ponto

Em relação à jogabilidade, Coralina não traz grandes inovações. Os controles são simples e o foco aqui é claramente fazer com que o jogador navegue pelos cenários e converse com os personagens para que se sinta parte da história. Os poucos puzzles presentes têm boas ideias, mas alguns podem ser frustrantes, especialmente porque nem sempre são claros para quem não está familiarizado com algum conhecimento prévio de algum assunto ou personagem histórico específico, por exemplo.

Quanto ao combate, ele é praticamente inexistente. O que parece ser um combate é, na verdade, uma sequência em que você precisa tomar a decisão correta, parecendo mais um filme interativo como Dragon’s Lair ou Time Gal (alguém se lembra?) em que você deveria decidir o caminho certo rapidamente para não morrer. Em Coralina, você deve escolher a opção de diálogo ou carta certa para não fracassar. No entanto, ao contrário dos filmes interativos, aqui você tem tempo para tomar sua decisão com calma.

Veredito: Recomendado

Coralina: A Memory Tale é um jogo recomendado para quem adora histórias que flertam com o psicodélico e o fantástico, e que nos dão um bom senso de aventura. Se você gosta de mergulhar em narrativas emotivas e cheias de acontecimentos inesperados, a história de Coralina certamente vale a experiência, contudo recomendo começar pelo primeiro jogo. Considerando os problemas citados, acredito que os aspectos gerais do jogo sejam refinados conforme a série avance, o que traz uma boa expectativa sobre o que está por vir.

Coralina é uma série de jogos com experiências interessantes e curtas. O capítulo zero tem por volta de duas horas e o capítulo um tem cerca de três horas, portanto, são curtos, mas relativamente baratos, o que já os torna uma recomendação fácil.  Contudo, não recomendado para quem espera um RPG com combates, não goste de ler ou que não tenha disposição para abrir-se a novas estéticas.

No meu caso, adorei e espero pelo próximo episódio.

Agradecemos demais ao pessoal da ZNT e Gabriel Maki pela chave fornecida! Valeu, pessoal!! ♥ 

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